Infecção de Corrente Sanguínea Relacionada a Catéteres: 10 verdades e 1 mito
Ponto de Vista Crítico:
O ser humano desde a época mais remota sempre foi fascinado pela ciência e pelas descobertas. O fogo, a roda, a escrita, a pólvora… Porém, muitas vezes a verdade nāo é tāo simples quanto parece. O homem na Idade Média acreditava através da observação que o Sol girava ao redor da Terra. Estudo observacional, cuja conclusão era baseado na constatação que o astro-rei Sol nascia ao leste, e se punha ao Oeste, dia após dia, sendo dessa forma lógico e verdadeiro que o Sol girava ao redor da Terra. Era uma “verdade” tão verdadeira, que o contrário era considerado heresia e era risco de ser queimado na fogueira. Não era fácil ser um homem da ciência nessa época. Era melhor ser um homem da fé.
Hoje temos acesso a inúmeros artigos e trabalhos, mas nossa observação, nosso ponto de vista pode estar equivocado.
Essa é a proposta desta coluna, um olhar crítico, um novo ponto de vista sob a Medicina Baseada em Evidencia e a Terapia Intensiva
Discutiremos sobre Infecção de Corrente Sanguínea Relacionada a Catéteres. (ICS-RC)
10 verdades sobre ICS – RC:
1 – Se o motivo da retirada do catéter não foi suspeita de infecção NÃO deve ser solicitado cultura de rotina
*** tratamos o paciente e não o exame. Se o paciente não tiver quadro clínico compatível ou suspeito de quadro infeccioso, será desperdício de tempo e dinheiro. Estaremos tratando um resultado de exame e não o paciente.
2 – Para confirmação de Infecção Relacionada a Cateter é necessário cultura positiva para ponta de catéter MAIS hemocultura periférica tambem positiva. Ou DUAS hemoculturas positivas (uma pelo catéter e outra periférica) devendo haver pelo metodo quantitativo um número de colônias 3x ou mais maior que na hemocultura periférica, ou crescimento com positivação pelo menos 2 horas antes pela cultura do catéter.
*** parece simples mas pode gerar confusão. Não é incomum ser tratado “infecções” apenas com cultura de catéter positivo. Seria realmente infecção ou apenas colonização? Por outro lado quando você especifica muito os critérios diagnósticos você diminui suas taxas de diagnóstico de infecçāo. O racional é o seguinte: se positivar apenas o catéter provavelmente deve se tratar apenas de colonização. Apenas cultura periférica, ou relação menor que 3:1 ou menos de duas horas de diferença, provavelmente a infecção é de outro sitio. A exceção a essa regra são quando estão envolvidos S. aureus ou Candida sp.
Esses aspectos devem ser lembrados quando analisarmos nossos próximos resultados de culturas
3 – Em ICS – RC envolvendo catéteres de longa permanência (permicath), devido a patógenos outros que S aureus, Pseudomonas aeruginosas, Bacillus species, Micrococus species e propionibacteria, fungos ou micobacterias por causa dos locais de acessos limitados em pacientes que requerem acessos intravasculares de longa permanência para sobrevivência (por exemplo pacientes dialíticos ou portadores de síndrome do intestino curto) o tratamento poderia ser realizado SEM remoção do catéter com uso de antibiótico sistêmico mais terapia fechada (“lock therapy”). Essa alternativa não incluiriam pacientes com Sepse Grave, Endocardite, Tromboflebite, ICS com mais de 72h de antibioticoterapia efetiva.
4 – Em pacientes cateterizados com UMA cultura positiva para espécies S. coagulase negativo DEVEM ser obtidas culturas adicionais através do catéter suspeito mais cultura periférica antes de iniciar antibioticoterapia e/ou retirada do catéter para ter certeza que o paciente tem ICR real e a fonte É o catéter
* apenas uma cultura positiva pode ser contaminação. Necessário pelo menos mais uma para confirmação.
5 – Para pacientes hospitalizados na UTI, com um novo episódio de febre MAS sem Sepse Grave ou evidência clara de ICS, obter hemocultura dos cateteres não-tunelizados e arteriais ao invés da remoção de rotina.
* menos de 20% dos cateteres retirados estāo envolvidos com infecção, levando a abuso de uso de antibióticos, e troca desnecessária de catéter associado a custo e risco de complicações ao paciente
6 – S coagulase negativo sāo a causa mais comum de infecção relacionada a catéter nāo complicados e o tratamento com antibiótico deve ser por 5-7 dias com a remoção do catéter, e 10-14 dias com terapia fechada (“lock therapy) se mantido catéter
* alternativamente podem ser observado sem Antibioticoterapia se o paciente não possuir dispositivos ortopédicos/intravasculares, com a remoção do catéter e adicionalmente evoluirem com culturas com ausência de bacteremia
7 – EVITAR usar veia femoral para acesso venoso central em pacientes adultos
* preferir usar veia subclávia ao invés de veia jugular ou veia femoral para minimizar risco de infecção. Veia femoral deve ser via de acesso de exceção.
8 – EVITAR sítio de punção subclávia em pacientes Dialíticos
* parece um contra-senso se baseado no item anterior, porém existem inúmeros outros fatores que somente infecção para decisão do sitio ideal de cateterirização como tipo de catéter, risco de complicações mecânicas (pneumotórax, sangramento), trombose, e nesse caso específico o risco de estenose venosa supera o beneficio de menor risco de infecção tornando o sítio jugular ideal para catéter para sorensen. Depois o sítio femoral, e por fim de exceção o sítio subclávio.
9 – Usar CVC com o mínimo de portos ou lúmens necessários-essenciais para o manuseio do paciente.
* resumindo, quanto menos catéter e menos lúmens melhor. Não há recomendaçōes para o uso de lúmens designados para nutrição parenteral. Permanece uma questão não-resolvida. Na prática, é comum o uso de uma via exclusiva para o suporte nutricional parenteral.
10 – PRONTAMENTE remover qualquer catéter intravascular que não seja mais essencial.
* a sabedoria está na simplicidade e essa talvez seja a “verdade” mais importante de todas. Prevenir é melhor que remediar. Para isso é importante o uso de checklists e atuaçāo de uma equipe multi-disciplinar para avaliar a real necessidade da permanência do catéter e a retirada do mesmo.
… E um MITO:
– TROCA de catéter com fio-guia.
* EVITAR. Seja na troca por rotina (evitar sempre troca de rotina, seja com fio-guia ou não) seja na troca por suspeita de infecção. Aceitável na troca por mal funcionamento sem suspeita de infecção. Aceitável.
Referências:
1. Mermel LA. Prevention of intravascular catheter-related infections. Ann Intern Med 2000; 132:391–402.
2. Naomi P. O’Grady. Guidelines for the Prevention of Intravascular Catheter-Related Infections, CDC, Center of Diseases Control, 2011
3. Mermel LA.Clinical Practice Guidelines for the Diagnosis and Management of Intravascular Catheter-Related Infection: 2009 Update by the Infectious Diseases Society of America
Autor
Dr. Max Pattacini